30 abr 2021

BRUNO KELLY/REUTERS

Por Hysa Conrado, do R7

Há mais de um ano o noticiário apresenta diariamente os números da pandemia: milhares de mortos em 24 horas. Na última quinta-feira (29), o desenho fúnebre desta tragédia ganhou mais um contorno: chegou a 400 mil a contagem de vidas perdidas para a covid-19 no Brasil.

O que o balanço não dá conta, e nem poderia, é de todas as histórias que foram enterradas e da sensação constante de luto coletivo vivenciada pelo país.

Estima-se que 86% dos brasileiros perderam algum conhecido, seja membro da família, amigo próximo ou não tão próximo para a covid-19. Os dados são de um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados em parceria com o Centro de Pesquisa em Comunicação Política e Saúde Pública da Universidade de Brasília.

Para o psicólogo Leonardo Goldberg, doutor em psicologia pela USP (Universidade de São Paulo), a sensação de luto compartilhado causada pela pandemia permanecerá como uma cicatriz no imaginário do brasileiro.

“Uma coisa é quando existem números, outra é quando existem nomes, então de uma contagem de mortos vivemos uma experiência pessoal. Isso pode desaparecer em termos de nomeação, de ser uma pandemia, mas nossa cultura vai ser impregnada por acontecimentos, gestos, ritos que a gente incorporou tanto pelo medo da morte quanto pela sensação de luto, e isso por muito tempo vai perseverar na nossa história enquanto país”, afirma.

Túmulo do soldado desconhecido

Uma das maneiras de amenizar esta sensação de luto compartilhado, segundo Goldberg, é realizar um movimento coletivo de despedida e, vale ressaltar, isto nada tem a ver com aglomerações e sim com o papel do estado em prestar homenagens póstumas às vidas perdidas durante a pandemia.

O psicólogo cita como exemplo o túmulo do soldado desconhecido, monumento tradicionalmente construído pelos Estados Unidos e por países europeus para homenagear soldados que morreram durante a guerra e que não puderam ser identificados.

“É como prestar homenagem para um, que representa as centenas de milhares de falecidos. Isso quer dizer um movimento coletivo de despedida e o Brasil não tem feito isso. Não podemos excluir o papel do estado. O selo oficial de uma homenagem póstuma tem que vir das autoridades. Só assim contamos a história do que aconteceu e de alguma forma prestamos homenagem a aqueles que se foram, como um rito fúnebre coletivo”, explica.

O especialista ainda destaca a importância de prestar homenagens individuais às pessoas que morreram em decorrência da covid-19, sobretudo neste cenário em que há uma supressão dos ritos fúnebres com a impossibilidade de realizar velórios de pessoas que morreram da doença.

“Hoje temos as redes sociais onde podemos escrever sobre os mortos, sobre a história e nossa relação com cada um, e de alguma forma honrar a história deles, já que não podemos ir ao cemitério, fazer velórios, fazer os ritos que são necessários. O que podemos é compartilhar de forma coletiva o que foi perdido, porque sempre perdemos um pedaço quando alguém que amamos se vai”, afirma o psicólogo.

Publicado originalmente em Notícias R7.

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