09 jul 2020

Quem é que já não se fez de desentendida, linda e confiante quando, na verdade, tinha algo embrulhado no estômago chamado ciúme? Bem, cada um reage do seu jeito, mas a cantora Anitta é do grupo que se identificou com a pergunta acima. Ao falar sobre como lida com o sentimento ao fazer um teste no Instagram, junto com a amiga Laryssa Bottino, disse que já fingiu estar tudo bem, mesmo com o ciúme a consumindo por dentro:
“Sempre! Sempre. Sempre. Eu não (falo), corroo por dentro. Deixo aquilo me comer por dentro”. Aí é que está. Até que ponto ‘”fazer a Anitta” e deixar o ciúme corroer faz bem?

De um passo lindo em autoconhecimento, uma pitadinha de amor no romance, à uma gastrite – e aqui a metáfora ou sensação de Anitta com seu estômago cai como uma luva – as consequências de um ciúme velado dependem de quão real é a desconfiança e de forma se lida com o sentimento.

De acordo com psicóloga Marina Alves, mestre em psicologia da saúde, guarda muito o ciúme pode ser emocionalmente perigoso. “A realidade pode ser confundida com sensações irracionais. Em seguida, se expande de tal forma que começa a criar fantasias. Existe, vamos dizer, 40% de realidade no sentimento de desconfiança que tenho do meu parceiro. E existe 60% de fantasia que eu crio numa situação de encharcamento emocional”.

É possível que a fantasia leve a algo que de fato não exista, segundo Jaroslava Varella Valentova, professora e pesquisadora de Sexualidade Humana do Instituto de Psicologia da USP: “Em geral, controlar ciúme é muito difícil. Várias pessoas gostariam de controlar ou até não sentir ciúme porque pode atrapalhar a vida delas e dos/as parceiros/as, ou até de outras pessoas (rivais).

Em vários casos o/a rival não é real, mas só imaginário, e isso é suficiente para o indivíduo sentir várias emoções negativas associadas com ciúme, como medo, humilhação, raiva, tristeza, etc. Muitas pessoas precisam de ajuda profissional para conseguir lidar com próprio ciúme e é um processo demorado e difícil”.

Para entender o que se passa e então decidir se guarda o ciúme ou não, tentando calcular as consequências, o ideal é ir por um caminho concreto. “Faça um diálogo consigo primeiro: ‘será que isso é verdade?’, ‘o que é fato’, ‘será que não estou extrapolando?’. Questione-se, organize-se e depois: ‘vamos lá bater um papo’. Atenção e cuidado para não se deixar tomar pelo sentimento, o que faz sair da realidade, e acabar reafirmando uma baixa autoestima com ‘eu tô errada’, ‘deixei de fazer o que ele queria’, ‘a/o rival é melhor’. Isso começa a ser autopunição”, acredita Marina Alves.

 

Gosto de comida estragada

Há sempre mais de uma caminho, mas no caso do ciúme velado, a questão deve ser resolvida antes de se cause danos maiores. “Faz mal deixar se corroer por muito tempo. É como comer uma coisa estragada que te foi fazendo mal, te fazendo mal e enquanto não te der uma diarreia, aquilo vai continuar te fazendo mal. Segurar o ciúme deixa a desconfiança presente e ela vai provocando um distanciamento do casal, um olhar meio persecutório”, diz Marina. “Já se eu explodir posso gerar grande estresse emocional, patológico mesmo, e dificuldade na relação, porque ficou muito explosiva, impulsiva.

Os estragos de corrosão podem acabar te levando ao médico, de acordo com o professor e pesquisador Thiago de Almeida, do Instituto de Psicologia da USP, e autor do livro “Ciúme e suas consequências para os relacionamentos amorosos”. Dores de cabeça, fraquezas, dermatites, gastrites; o sentimento pode afetar, inclusive, a saúde mental. “Esconder emoções, que são inerentes ao ser humano, tais como o ciúme permanentemente, é promover um desconforto e prejudicar o bem-estar de tal forma a ser capaz de estabelecer as bases de vários transtornos mentais como depressão e crises de ansiedade, além de poder nos prejudicar socialmente, profissionalmente, familiarmente e intimamente, provocando, por vezes, sérios conflitos em quaisquer um desses settings”.

Por outro lado, fazer a Anitta e não demonstrar o ciúme ajuda a manter os pés no chão, a cabeça focada e o coração firme: “Quando eu trabalho numa área em que posso me questionar em termos de racionalidade é positivo. O que eu tenho de realidade, de fato, nessa situação? Assim, transformo aquilo em uma coisa mais concreta e vou poder realmente falar: sim, não ou existe uma probabilidade de 20%, por exemplo. Então é hora de assentar e esperar o que está por vir”, acredita Marina Alves.

 

Uma pitadinha de amor

Nem tudo são trevas, claro. Até porque existem várias formas de ciúme e, sim, de acordo com os especialistas, tem um ciuminho bom.

Em geral, o ciúme reativo – quando se reage a alguma atividade que gera o ciúme, tal como comportamento íntimo do parceiro/a com outra pessoa – é o mais comum, segundo Jaroslava Valentosa. “Este tipo é o mais esperado e até desejado. Algumas pessoas exigem do parceiro/a exibir algum tipo de ciúme em algumas situações, e consideram tal reação como prova de amor. Então, em alguns casos, o ciúme aberto pode ser saudável, se não for exagerado, claro. Em outros casos, pode ser melhor esconder o ciúme e não reagir de forma exagerada.

Mas não é fácil, pode levar a diminuição de autoestima e ter consequências negativas para a pessoa. Por exemplo, se a pessoa sente ciúme porque o parceiro/a adicionou o/a ex no facebook, seria melhor falar e resolver, ao invés de ficar com dúvidas por muito tempo, o que pode piorar a qualidade do relacionamento em vários outros níveis”.

Dosar o que demonstrar ou não em termos de ciúme pode ser, num outro ângulo, uma pitada de amor. Alguns comportamentos podem fazer a pessoa se sentir amada pelo outro; sentir que outro não quer a perda. “Se ele sai toda noite e eu ‘não estou nem aí’ ou finjo não estar, isso pode provocar um sentimento de desamor, algo como: ‘puxa vida, queria que você estivesse aqui comigo’. Quando se fala sobre, eu posso dar a ele a possibilidade de entender que ele faz falta, e vice e versa. Tem uma graduação. Zerar não é legal. Numa escala de zero a 10, poderíamos dizer que quatro é o saudável para a relação”, acredita Marina Alves.

 

Por Marcela de Genaro

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