Do corpo… ao discurso1

Sidi Akofaré2


Eis que me encontro encurralado para dar a esse título o quê? Um corpo, justamente! Para fazê-lo, foi preciso que me detivesse aqui um pouco mais. Dei-me conta, logo de início, do quanto a questão do corpo divide a comunidade dos psicólogos e dos psicanalistas. Que se recomende o abandono puro e simples da noção de corpo em benefício daquela de corporal – o adjetivo substantivado, portanto – faz-se por si só sintoma e deveria, consequentemente, incitar-nos a refletir sobre o uso e os desafios dos conceitos que empregamos. A orientação lacaniana em psicanálise impõe, ao contrário, não somente pensar o corpo mas colocá-lo no coração, no centro mesmo da psicanálise enquanto prática e discurso. Desde 1960, Lacan insistia: “Pois a psicanálise implica, é claro, o real do corpo e o imaginário de seu esquema mental”3.

Esta posição só pode sustentar-se, contudo, com a condição de considerar que a psicanálise promoveu uma concepção não trivial do corpo, que lhe é tão essencial quanto a teoria do significante. Eu decomporia voluntariamente esta contribuição específica trazida pela psicanálise à questão do corpo, via ensino de Lacan, em três temáticas ao mesmo tempo distintas e articuladas, amarradas mesmo.

A primeira relaciona-se à evidenciação das relações entre o corpo e a linguagem e mesmo à determinação linguageira do corpo. Ou seja, isto que nas elaborações de Lacan conduz, por um lado, à distinção entre organismo e corpo e, por outro, ao estatuto do corpo como lugar e mesmo como “leito do Outro”.

A segunda é relativa ao gozo e, mais particularmente, à pulsão como “eco no corpo, dado que há um dizer”, ou seja, o sintoma como “acontecimento de corpo”.

A terceira, enfim, relaciona-se à promoção do corpo como “consistência imaginária” no nó borromeano. O que Lacan enfatiza, desde então, não é simplesmente que o corpo seja imaginário – é este o estatuto que se deduz do estádio do espelho –, é que “o imaginário é o corpo”.

Três pontos de vista, portanto, três perspectivas que desvelam e insistem alternadamente sobre os estatutos simbólico, real e imaginário do corpo. Para hoje, acrescentaria simplesmente isto: todas estas elaborações dizem respeito, por assim dizer, ao corpo como participante da estrutura e muito precisamente da estrutura do falasser, enquanto não redutível ao sujeito do significante. Sem dúvida, a contribuição e o ganho, tanto clínicos quanto epistêmicos, destas elaborações estão longe de serem insignificantes ou negligenciáveis. Não obstante, nenhuma delas diz algo decisivo sobre o corpo na modernidade e na pós-modernidade, sobre o corpo “historizado”, ou seja, tomado entre estrutura e história. De onde me veio a idéia, muito tempo depois o título, de interrogar o corpo a partir da perspectiva lacaniana mais afinada com a história e as variações “culturais”: a categoria de discurso.

Falei, acima, de uma concepção não trivial do corpo em Lacan. Evocando-a, não pensava nem no corpo do estádio do espelho nem no corpo no qual Lacan identificou o anel imaginário do nó borromeano. Pensava muito precisamente na doutrina sobre o corpo proposta por Lacan em 1970, em sua “Radiofonia”, texto contemporâneo de O avesso da psicanálise. Por si só, esta contemporaneidade da doutrina de Lacan sobre o corpo e da construção de sua teoria do laço social, sua doutrina dos quatro discursos, convida-nos a determo-nos um pouco sobre o conceito de corpo que Lacan forja para a psicanálise.

Em 1970, apesar dos gigantescos esforços empreendidos, notadamente desde seu seminário X, A angústia, o ensino de Lacan foi reduzido, por sua recepção e por sua percepção exterior, a A instância da letra no inconsciente ou a razão após Freud, ou seja, à estrutura da linguagem do inconsciente e às leis de substituição e conexão significantes: metáfora e metonímia. Deduzia-se daí uma concepção da psicanálise que parece considerar o corpo como completamente perdido, chegando até mesmo a ignorar os afetos. Em todo caso, é isto que gostariam de crer alguns, essencialmente André Green (cf. Le discours vivant). Daí a intervenção de Lacan em 1970. Para enfatizar o quê? Que nenhum avanço feito por ele sobre a linguagem e seus efeitos poderia ser concebido sem o corpo, sem o suporte do corpo como lugar da voz, da memória, dos efeitos significantes e dos efeitos de gozo: prazer, desprazer, satisfação, sofrimento, dor.

Com efeito, basta considerar as coisas a partir do ângulo da fenomenologia da experiência para convencer-se. O desejo de conhecer-se melhor raramente, para não dizer jamais, leva um sujeito a consultar-se com um psicanalista. Mais frequentemente, para não dizer sempre, é um desarranjo, uma ruptura da homeostase subjetivante, falhas na economia de seu gozo: repetições dolorosas, compulsões e impulsos incontroláveis, sentimento de insatisfação ou impotência, fenômenos corporais ou mentais paradoxais, absurdos ou subjetivamente opacos. Estas manifestações diversas ordenam-se facilmente a partir da tríade com a qual Freud intitulou uma de suas obras: inibição, sintoma e angústia.

Pode-se certamente intelectualizar profusamente e articular a inibição, o sintoma e a angústia com as três grandes questões kantianas: o que posso saber? O que devo fazer? O que me é permitido esperar? Nesta perspectiva, vê-se bem que o sintoma enquanto “retorno do recalcado” tem a ver com o saber, com o “não quero saber de nada disso”, em que consiste o recalcamento. Da mesma forma a inibição, enquanto “limitação funcional do eu [Moi]” é do domínio do fazer, do ponto de vista do negativo – eu não posso…, “eu não consigo” – com a renúncia que inscreve sua marca. Por fim, a angústia, enquanto espera ansiosa pelo acontecimento, introduz o falante na dimensão do tempo, a seus efeitos e in fine à morte. Mas o que nenhuma filosofia saberia apagar – mesmo se pudesse evitá-la, contorná-la ou ignorá-la – é a implicação fundamental do corpo em cada uma dessas manifestações. A ponto de que o sintagma forjado por Lacan para o único sintoma, parece-me, pode estender-se incontestavelmente aos dois outros: “acontecimentos de corpo”. Se tudo isto que acabo de retomar ou de propor for correto, concordaríamos que é justificado que Lacan retome a questão. Tudo isso para demonstrar que ele não ignora nem desconhece o corpo. Muito pelo contrário.

É com isso que ele rompe, com uma certa idéia de corpo e com a concepção espontânea e ingênua que considera o corpo como um dado bruto e imediato. Esta concepção seria antes a da psicologia – que confunde corpo e organismo.

Lacan procede de forma diferente. Ele parte da hipótese, verificada pela clínica, de que o corpo, no ser falante, seria antes um efeito. Mais precisamente, o corpo seria o produto de um processo de simbolização e de investimento libidinal do organismo. Desde então, a psicanálise está em condições de formular questões nunca postas pela psicologia:

– O que é um corpo?

– Como ele se constitui?

– Em quais registros do ser e da experiência humana (S, R ou I) ele se inscreve?

Estas questões, como todas aquelas que são determinantes em psicanálise, são correlatas a do Outro e a do gozo. As categorias de Outro, de simbólico, de linguagem, de gozo e de objeto constituem os operadores essenciais desta elaboração.

Chego então às teses as mais inovadoras de Lacan em Radiofonia, que considero seu texto de referência sobre o corpo. Pode-se decompor sua densa articulação em duas proposições:

– Para todo falasser, o verdadeiro corpo, o primeiro corpo, é o corpo dos significantes, o corpo do simbólico, isto é, a linguagem.

– A linguagem é corpo que dá corpo; e este não é um mero jogo de palavras. Isso quer dizer muito precisamente que o verdadeiro corpo humano (versus organismo), o corpo capaz de gozo, o corpo apto ao amor e ao desejo é uma atribuição linguageira, isto é, o extremo oposto de um dado natural imediato.

A tese mais radical que a psicanálise autorizou-se a formular sobre o corpo, então, enuncia-se: é o corpo do simbólico que faz o corpo “entendido no senso ingênuo”. Incorporação é o nome da operação pela qual se realiza, efetua-se o corpo do falasser na medida em que esta operação assegura a passagem do simbólico no organismo que ele converteu em corpo. Em conseqüência do quê, uma vez incorporado, o corpo do simbólico torna-se incorporal, atestando assim que o simbólico tem como causa o corpo, que o simbólico é corpo – de ser agrupamento e articulação. Se, incorporal, o simbólico faz a realidade, é como “incorporada que a estrutura faz o afeto”, ou seja, o efeito sobre o corpo de um dizer. Portanto, o afeto não é, nesta perspectiva – sem ofensa a A. Green – um fenômeno energético ou infra-linguístico. Ele resulta de que incorporado à estrutura (a linguagem), afeta o corpo. Desta subordinação do corpo à estrutura de linguagem, Lacan conclui que “do corpo, é secundário que ele esteja morto ou vivo”. Uma tal afirmação não deixa de surpreender, sobretudo se ela é entendida como: para um determinado sujeito, é secundário que seu corpo esteja morto ou vivo. Mas seria um grande contra-senso entendê-la assim. Este enunciado só se esclarece, com efeito, quando é relacionado às considerações desenvolvidas sobre a sepultura: “Quem não coonhece o ponto crítico pelo qual datamos, no homem, o ser falante? – a sepultura, ou seja, o lugar onde se afirma de uma espécie que, ao contrário de qualquer outra, o cadáver preserva o que dava ao vivente o caráter: corpo. Permanece como corpse, não se transforma em carniça, o corpo que era habitado pela fala, que a linguagem corpsificava4.

Do corpo de um ser falante, do corpo Um que habitava a palavra, a morte só tira a vida, isto é, sua aptidão ao gozo. A morte não pode retirar do corpo nenhum outro dos atributos que ele detém da linguagem e do discurso. Tudo o que em um tal corpo resulta de sua corpsificação pela linguagem perdura para além da morte, ou mesmo aumenta. Daí se deduz que o corpo não é nem identificável, nem redutível ao vivo a partir do qual ele se efetua, pois mesmo morto resta um corpo, um corpo de falasser. Esta distância colocada entre o suporte real, o vivo e o corpo corpsificado pela incorporação do corpo do simbólico conduzirá Lacan a definir o corpo principalmente a partir de sua determinação simbólica: “o corpo, a levá-lo a sério, é, para começar, aquilo que pode portar a marca adequada para situá-lo numa sequência de significantes. A partir desta marca, ele é o suporte da relação, não eventual, mas necessária, pois subtrair-se dela continua a sustentá-la”5.

Assim, para a psicanálise o corpo é primeiro superfície de inscrição. Enquanto tal, recebe uma marca – traço unário – que o eleva a uma função significante que transcende seu ser vivente. A partir da inscrição desta marca sobre o corpo, esta última acede a seu estatuto de suporte da relação do sujeito a si mesmo – à sua imagem, ao seu nome, ao seu gozo – e do sujeito ao outro, aos outros. É esta implicação necessária, não contingente ao corpo como “suporte da relação” que faz, entre outros, o valor das categorias de gozo e de discurso (ou laço social) e, conseqüentemente, de sintoma.

Suportar a relação não quer dizer, de forma alguma, suportá-la exclusivamente pela presença, dado que também se pode suportá-la subtraindo-se dela. A histérica pode, aqui, dar testemunho de saber que este é um laço que se sustenta sobre o fato dela furtar-se como objeto! Esta subtração permite introduzir um modo de eficácia do corpo como faltante, retirado, velado ou recusado, mas não obstante suporte de um laço. É esta noção de subtração que constitui a chave da passagem do corpo como significante, como contabilizável e como superfície de inscrição, ao corpo como Outro e como (-1). “Desde tempos imemoriais, Menos-Um designa o lugar que é dito do Outro (com a inicial maiúscula) por Lacan. Pelo Um-a-Menos faz-se a cama para a intrusão que avança a partir da extrusão: é o próprio significante.”6

Mantemos aqui o estatuto do corpo em sua relação com o saber e com o gozo junto a uma definição do Outro. Esta localização do corpo é completamente congruente com o que Lacan dizia sobre o corpo em 1967: “Com terceiro ‘mais além’ em sua relação com o gozo e com o saber, o corpo faz leito para advento do Outro pela operação do significante. Mas, com esse efeito, o que resta dele? Insensível pedaço a derivar dali como voz e olhar, carne devorável, ou então seu excremento, eis o que dele vem a causar o desejo, que é nosso ser sem essência.”7 No fundo, o processo continua, portanto, o mesmo. Pela incorporação do corpo do simbólico, o organismo corpsifica-se. Desta operação constitutiva do corpo, não somente este se encontra marcado (marca de pertencimento e/ou marca erótica), mas igualmente vem fazer o leito do Outro, este leito pelo qual se opera a metáfora do Outro, a substituição do Outro pela coisa. O efeito desta operação é de fragmentação do corpo e de seu gozo que, falando de maneira precisa, o deserta para se refugiar e condensar-se em suas quedas – contingências corporais – que são as diferentes figuras do objeto a (seio, excremento, voz, olhar).

Chego agora a meu segundo desenvolvimento, do qual o precedente constituía um requisito. Trata-se de examinar o que é um corpo quando se passa de sua constituição e de sua estrutura à sua função, notadamente no laço social. Para ser breve, eu diria que se trata de fazer o salto necessário da passagem do saber (igualmente inconsciente) como laço entre os significantes ao discurso, que é por sua vez laço entre os corpos. Definição para ser retida, que completa e empresta toda sua força àquela mais comum, de que o laço social é fundado pela linguagem. E é a psicanálise que o demonstra. Com efeito, a análise não seria a experiência freudiana que é – isto é, uma experiência do inconsciente, mas considerando que sua realidade é sexual – se a função significante do corpo – que Freud estabelecia já a partir da clínica da conversão histérica –, se seu estatuto de Outro – notadamente de superfície de inscrição – esgotasse aí seu sentido e sua significação.

Que nos coloquemos do ponto de vista da experiência analítica, do discurso analítico ou do processo de subjetivação, a alteridade do corpo não se traduz exclusivamente em termos do corpo do sujeito. É que, considerado como suporte da relação, o corpo do sujeito diz respeito ao corpo do Outro; dito de outra forma, que o corpo seja Outro para o sujeito não apaga a questão do que é o corpo do Outro e do gozo real ou suposto deste corpo. É neste ponto que se situa, em psicanálise, o enigma fundamental ligado a seu real próprio, aquele da inexistência da relação sexual. Não é também o ponto de onde surge a interrogação relativa ao desejo que conduz os sujeitos a dedicar sua vida de trabalho a se deitar de modo que surja uma história que valha a pena? Mas isso nos levaria para longe demais. Tentemos dar um passo a mais.

Eu já o evoquei: a amarração do corpo e do discurso é o ponto de partida. Com efeito, o que Lacan chamou de discurso não é nem um laço natural nem um laço gregário. Se ele o definiu como um laço e não como uma relação, é justamente porque o laço é o que assegura a coexistência sincrônica de dois ou mais termos. E se ele o chama de “laço social”, e não simplesmente de “laço de linguagem”, é porquanto os termos cuja coexistência sincrônica ele assegura não são puros significantes mas sim corpos. Dito de outra forma, o agente (o semblante) e o outro de cada um dos discursos fundamentais de Lacan são sempre suportados pelos corpos. E quando este não é o caso, como no discurso da ciência ou no discurso do capitalista, bem, temos “discursos” que não fundam laço social! Minha tese, portanto, torna-se precisa. A questão do corpo no discurso é, de início e antes de mais nada, a questão da presença corporal, a questão da pulsão e a questão dos gozos.

Concordaríamos facilmente em reconhecer que os discursos fundamentais isolados por Lacan se ocuparam corretamente dessas questões, e mesmo constituindo modos apropriados de tratamento. Desde então, não são esses discursos fundamentais os que provavelmente mais nos ajudam a apreender aquilo que diz respeito ao corpo na modernidade/pós-modernidade, cuja determinação discursiva deve-se pesquisar mais do lado do discurso da ciência e do discurso capitalista. Para apreender este deslocamento operado ou, em todo caso, a ponto de sê-lo, basta recordar o que foi essencialmente esta presença corporal:

– presença do corpo na e pela palavra, na relação;

– presença do corpo no sexual, o encontro do Outro sexo, no amor;

– presença do corpo no e pelo trabalho, os laços de trabalho, a economia.

Estas presenças, deve-se lembrar, eram sustentadas por um Outro muito consistente que não se faz mais presente hoje. Se considerarmos, de acordo com Lacan, que a dominação do discurso da ciência e do discurso capitalista está no fundamento desta ruína do Outro, não é surpreendente que a pós-modernidade – conceito que deve aqui substituir o de modernidade, apoiando-se sobre o que nos ensinou Jean-Françoise Lyotard8
–, tal como se dá para nós, apresenta-se como um processo, um movimento indo no sentido da retirada, do apagamento, da subtração progressiva do corpo por uma tripla recusa, rejeição ou mesmo retraimento:

– recusa, rejeição ou retraimento da palavra, portanto da narração, do contar, por conseguinte da historização da verdade: foraclusão da verdade (cuja estrutura é, não nos esqueçamos, de ficção) como causa;

– recusa, rejeição ou retraimento das “coisas do amor”, tão bem denunciados por Lacan como sendo o fundamento do discurso capitalista;

– recusa, rejeição ou retraimento do corpo produtor em uma economia tendenciosamente automatizada, robotizada e financiarizada. A partir desse momento, os modos de retorno deste corpo são violentos e eruptivos, e são de fato clinicamente perceptíveis:

  • Promoção narcísica, ou seja, fetichização do corpo através de diferentes usos e práticas: certas formas de práticas esportivas em voga,

  • Submissão e redução do corpo a uma função de puro suporte de sintoma separado do Outro e tomado na deriva metonímica de um gozo sem freio: bulimia, anorexia etc.

  • Disponibilização do corpo para proveito de ideologias que o fazem servir como objeto de violência ou sacrifício,

  • Manifestação no real sob a forma de objetos corporais dissociados, separados, ou mesmo virtuais: voz, olhar. Não nos encontramos mais, deixamos mensagens de áudio, enviamos SMSs, e-mails ou vídeos!

Sem dúvida, seria difícil reduzir a psicanálise a uma prática ou a um simples uso dos corpos. Além disso, não é desejável que ela o seja. Não obstante, enquanto prática e discurso – e mesmo quando Freud encarava-a somente como talking cure e Lacan como prática e função da palavra no campo da linguagem –, a psicanálise é fundamentalmente enraizada no corpo, requer o encontro dos corpos e opera pelo seu modo de eficácia própria sobre estes. Resta que – e o diagnóstico é unânime – o discurso da ciência e o discurso capitalista vão cada vez mais, em razão de sua dinâmica própria e da virtualização do mundo que eles instauram, no sentido de uma redução extrema da presença e de um maior alcance do “elástico pulsional” (C. Soler), ou seja, a curva que vai inserir os objetos. É, parece-me, ao nível das incidências destas mutações sobre o laço social, e em particular sobre a função sintoma do corpo do Outro, do Outro como parceiro do sujeito – função que eventualmente o analista pode saturar/encarnar, que a questão deve ser retomada e as pesquisas, feitas.

1 Publicado originalmente com o título “Du corps… au discours”, em Gaspard, J.-L. e Doucet, C. (org.), Pratiques et usages du corps dans la modernité (pp. 59-66). Éditions érès: Toulouse, 2009. Traduzido por Luiz Eduardo de Vasconcelos Moreira e Pedro Eduardo da Silva Ambra.

2 Maiîre de conférences, Docteur d’État, psicanalista, Equipe de pesquisas clínicas, EA 3278, Universidade de Toulouse Il-Le Mirail.

3 J. Lacan, 1960, “Subversion du sujet et dialectique du désir dans l’inconscient freudien”, em Écrits, Paris, Le Seuil, 1966, p. 804. (Nota do Tradutor: Edição brasileira: “Subversão do sujeito e dialética do desejo no inconsciente freudiano”, em Escritos, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1998, p. 818.)

4 J. Lacan, 1970, “Radiophonie”, em Autres écrits, Paris, Le Seuil, 2001, p. 409. (Nota do Tradutor: Edição brasileira: “Radiofionia”, em Outros escritos, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 2003, p. 407.)

5 Ibid., p. 409.

6 Ibid.

7 J. Lacan, 1968, “De la psychanalyse dans ses rapports avec la realité”, em Autres écrits, Paris, Le Seuil, 2001, p. 357-358. (Nota do Tradutor: Edição brasileira: “Da psicanálise em suas relações com a realidade”, em Outros escritos, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 2003, p. 357.)

8 J.-F. Lyotard, La condition postmoderne, Paris, Les Édtitions de Minuit, 1979.