04 set 2019

 

Estratégias bélico-militares utilizam como arma “a retórica desestabilizadora de memórias”. A distribuição de fake news ancorada no uso do big data, conferindo um efeito em massa, abalou estruturas em todo o mundo. Estudiosos chamam o fenômeno de guerra híbrida. O Brexit e a União Europeia, Donald Trump, nos Estados Unidos; Jair Bolsonaro, no Brasil; Rodrigo Duterte nas Filipinas; dentre outras eleições, além da escalada da repulsa aos imigrantes na Europa, são alguns dos produtos já consolidados dessa estratégia.

O mundo vive um momento de ruptura, mas ainda não é possível avaliar quais serão as consequências no longo prazo. “É uma guerra cujo oponente desconhecemos”, aponta a professora emérita Eda Tassara, do Instituto de Psicologia (IP) e coordenadora do Grupo de Política Ambiental do Instituto de Estudos Avançados (IEA), ao Jornal da USP no Ar. Ela explica que não se trata de um conceito consolidado, mas o desenvolvimento dos fatos indica a existência de uma ordem organizadora oculta.

“A guerra sempre tem dois lados. Se tem um lado, porém, não há clareza, porque o ponto de difusão é etéreo”, esclarece Eda. A professora, graduada em Física, fala que o uso intencionado da informação pressupõe um amplo domínio sobre o conhecimento das ciências duras. “A possibilidade de rede social ocorre durante a Segunda Guerra (Mundial), decorrente de uma engenharia de redes eletrônicas”, discorre.

Isso acarretou na globalização, partindo da humanidade europeia, conforme a especialista. Apesar do antiglobalismo, a docente alega que “não há mais possibilidade de retorno, pois esse processo se reificou por meio da engenharia de redes”. Ou seja, deixou de ser uma abstração para se manifestar concretamente na realidade. “Por outro lado, essa máquina impõe a uniformização cultural, visando ao consumo em massa”, expõe.

Assim sendo, surgem instrumentos para influenciar as decisões da sociedade. “Essa estratégia busca se sacramentar pela absorção dos conhecimentos das áreas humanas”, argumenta Eda. As informações contidas no Big Data são conhecimentos gerados em Sociologia, Demografia, Antropologia e também pela Psicologia. Então, o uso dessas ferramentas permite a imposição de alguns pensamentos estratégicos, de acordo com ela.

A professora explica o híbrido como aquilo que mistura de forma a resultar em monstros. “É uma abordagem não iluminista. Ao contrário do que se deveria se supor em uma sociedade altamente cientifizada, utiliza a ciência para uma política obscura”, acusa. De acordo com ela, as estratégias também se assentam na negação do outro, como se vê no caso dos supremacistas.

A conjuntura delicada demanda uma resposta. O primeiro passo é uma política transparente, mas isso só não basta. “É preciso um antagonismo novo diante de uma situação nova. Uma solução extremamente complexa, porque depende de uma iniciação de pensamento. Ou seja, aquela palavra pouco usada mas nunca realizada: educação”, afirma.

 

Ouça a entrevista na íntegra no áudio abaixo:

 

Por Pedro Teixeira
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